segunda-feira, 31 de agosto de 2009

A arte de falar durante um filme

Quando aparece gente nova no Goteira, eu faço questão de avisar que é completamente permitido se manifestar durante a exibição do filme. O que seria incômodo em qualquer outra sessão de cinema, numa sala que não a das casas, aqui se torna uma coisa essencial.
Como muitos já dizem por aí, o filme é o produto da interação do ecrã com a platéia. Dependendo da forma que se assiste, as impressões podem ser diferentes. Portanto, o estímulo às manifestações é parte de um projeto de, digamos, "debate em tempo real", sem a preocupação com termos, palavras e etc; que torna essa interação citada bastante sincera e dinâmica. Além disso, a manifestação no escuro (literalmente) dá aos tímidos a chance de falar o que estão achando, coisa que não fariam (e não fazem!) com as luzes acesas e com a atenção dos presentes.
Porém, as manifestações não se resumem a sinceridade e desinibição. Toda opinião emitida durante a projeção pode ser completamente alterada ao final da sessão, seja por uma nova interpretação ou, principalmente, por uma nova informação dada pelo filme. Assim, a surpresa que alguém teria em silêncio é compartilhada com toda uma sala e cria uma espécie de sentimento homogêneo que só essa relação público/filme é capaz de fazer e, claro, só esse "debate em tempo real" torna possível.
É incômodo estar num cinema e ouvir pessoas falando alto, atrapalhando. O fato é que esses "chatos" não estão articulando idéias com você. No Goteira, a intenção é fazer todo o grupo compartilhar gritos, xingamentos e expressões que podem incomodar, fazer rir ou até mudar a visualização de quem as ouve.
Falar durante o filme é um ato saudável que torna cada exibição única, já que cada platéia criará uma forma e uma expressão diferente para se comunicar com o meio e com a obra.
Alguém faça o favor de perguntar "E daí?".

MT

Foto de "Sem Essa Aranha", Rogério Sganzerla
Não me perguntem o que ela tem a ver com o texto